Ciclovia para integrar
Subprefeitura de Santo Amaro, em São Paulo, realiza projeto cicloviário de 38,21 km interligado aos modais de transporte e às áreas escolares e comerciais do bairro. Conheça as tipologias e soluções adotadas
Por Marina Pita - do site: http://www.infraestruturaurbana.com.br
Para
melhorar a mobilidade local, conectar os equipamentos urbanos e
integrar os modais de transporte público do bairro de Santo Amaro, em
São Paulo, a subprefeitura local projetou uma malha cicloviária que
abrange todo o território do distrito - novidade para a capital paulista
que, por ora, só possui ciclovias isoladas. Já aprovado e licitado, o
projeto conta com 38,21 km de ciclovias - São Paulo inteira tem 47,2 km
-, em 44 vias. Com três fases de implantação, a ciclovia de Santo Amaro
pretende oferecer vias seguras para ciclistas a menos de 500 m, de onde
quer que ele esteja no bairro.
Criar
essa malha viária, de acordo com os objetivos, não foi fácil. Como o
território de Santo Amaro foi um município independente da capital por
quase 100 anos - 1832 até 1935 - ele se estruturou de forma autônoma,
com regiões de vocações diversas. O distrito de Santo Amaro da atual
subprefeitura, por exemplo, equivale a um pequeno centro comercial,
inclusive com vias fechadas ao tráfego de carros. Há também zonas
residenciais, sendo uma caracterizada pela ocupação de população de alta
renda. Já a área residencial ocupada por população de baixa renda é
praticamente um bairro dormitório.
O
projeto desenhado pela TC Urbes, vencedora da licitação para realização
do projeto, teve então de analisar todas estas questões cuidadosamente.
O ponto de partida foi o Plano Regional Estratégico da subprefeitura,
no qual algumas vias foram indicadas como cicláveis, mas sem maiores
definições, apenas como indicativo da necessidade de aprofundamento
deste estudo.
A
partir daí foram levantadas as vias de transporte sobre trilhos, as
linhas de ônibus, o planejamento de transporte por meio dos Planos
Integrados de Transporte Urbano para 2020 e 2025. Todos estes dados
cruzados levaram à definição de pontos de encontro das linhas de
transporte, onde as ciclovias foram inseridas. "Elas foram desenhadas em
paralelo às vias de transporte existentes e de forma complementar, sem
sobreposição", explica Ricardo Corrêa, diretor da empresa de mobilidade e
projetos urbanos TC Urbes.
Segundo
ele, um dos fatores para o sucesso da malha cicloviária é justamente
encontrar vias para o trânsito das bicicletas que sejam eficientes e
evitem áreas de tráfego de veículos motorizados intensos, ao mesmo tempo
em que interliguem a rede de transporte público.
Traçado de ciclovia perpassa áreas de instituições de ensino, de comércio e serviços, onde se observa alta concentração de tráfego, como mostrado nos mapas |
Traçado
Mas
criar uma malha cicloviária e colocá-la em funcionamento não é algo
simples em uma cidade projetada há cerca de 100 anos para atender
prioritariamente ao transporte motorizado. Neste sentido, a criação do
plano cicloviário e seu trajeto considerou a necessidade de educação
para o uso e adaptação da população.
Por
isso, a TC Urbes realizou o levantamento das creches, escolas e
universidades existentes no território de acordo com o número de
usuários. "A educação deve ser uma das bases do planejamento
cicloviário. E isso ocorre de forma transversal a partir do momento em
que a ciclovia passa na porta da escola. A criança vai aprender como
funciona o sistema e as leis de trânsito. Seja desde pequeno sendo
levado pelos pais ou, mais velho, por conta própria", avalia o
arquiteto.
Outro
dado importante para o planejamento e desenho do traçado foi a
identificação das áreas de concentração de comércio e serviços. Quanto
maior a quantidade de lojas, restaurantes e empresas, maior a
necessidade de ciclovias. O posicionamento das ciclovias da
subprefeitura de Santo Amaro também foi influenciado pelo tipo de uso do
solo. No caso de áreas com muito comércio e serviço, foram projetadas
junto às calçadas.
A
localização de espaços culturais e de áreas verdes e de lazer foi feita
para que o plano incluísse estes pontos de atração e ampliasse a área
atendida por cada um deles, uma vez que facilitará o acesso e saída.
A
topografia é então cruzada com todos estes dados. De acordo com Corrêa,
existe uma supervalorização da questão relevo em planos cicloviários.
No caso das cidades brasileiras, este tópico deve ser trabalhado como,
apenas, mais um elemento, segundo ele. "Não temos relevos impeditivos,
tal como nos Andes, por exemplo."
O
território de Santo Amaro, por exemplo, é bastante favorável. Boa parte
de sua área de abrangência é ocupada pela várzea do rio Pinheiros, com
declividades de 0% a 1%. Os terrenos com declividade entre 1% e 7%,
considerados favoráveis ao trânsito por meio de bicicleta, ocupam por
volta de 80% da subprefeitura.
Apenas
a região leste é montanhosa e de topografia acidentada. Esta área
requereu maior conhecimento de curvas de nível para definição das
melhores vias para circulação por este modal. Para isso, foi levantada a
carta clinográfica.
A
inclinação das vias também foi usada para definição das fases de
implementação do plano cicloviário, sendo que as primeiras ciclovias de
Santo Amaro irão se localizar na região de várzea, onde é mais fácil o
tráfego de ciclistas pouco experientes e iniciantes.
Depois
de todo o levantamento teórico e muito trabalho de prancheta, os
arquitetos da TC Urbes então partiram para a fase prática. Pedalaram
cerca de 200 km na subprefeitura antes de finalizar o traçado das
ciclovias. Segundo Corrêa, há ajustes que devem ser feitos em campo.
"Consegui encontrar uma rota alternativa à avenida Vereador José Diniz
apenas pela experiência em campo. Além disso há questões de segurança
que se conhece só no local, conversando com os ciclistas."
Terrenos com declividade entre 1% e 7% são considerados favoráveis ao trânsito por bicicleta. Na carta clinográfica do bairro de Santo Amaro, vê-se que o intervalo corresponde a 80% da área da subprefeitura |
Após
a definição das vias, foi feito estudo detalhado para definir a
tipologia adequada a cada uma delas tanto para a segurança do ciclista,
quanto para não atrapalhar o tráfego de carros e ônibus.
De
acordo com Corrêa, a infraestrutura para o tráfego de bicicletas vai
variar de acordo com duas condições: o volume de transportes motorizados
e a velocidade média em que trafegam. Quanto maior a velocidade e o
volume de carros, maior será a necessidade de segregar veículos
motorizados e ciclista.
Neste
projeto foi concedido espaço confortável e suficiente para o ciclista
em todas as vias - sejam elas segregadas visual ou fisicamente -, tendo,
no mínimo, 1 m de largura e chegando até a 1,8 m, sempre ponderando
conflitos com pontos de ônibus e pedestres.
Já
o posicionamento das ciclovias depende basicamente do uso do solo no
local, de acordo com Corrêa. Em pontos com grande quantidade de comércio
e serviços, a ciclovia deve estar próxima à calçada. "As ciclovias no
canteiro central são adequadas apenas onde não há atividade comercial.
No caso de Santo Amaro, em especial, na região da Nações Unidas." A
ciclovia bidirecional em canteiro central foi escolhida para que fosse
separada do fluxo de automotores, pois estes se encontram em grande
quantidade e trafegando em alta velocidade.
Em
outros casos, outras tipologias são mais indicadas, como é o caso da
rua Visconde de Taunay e Alexandre Dumas, onde a opção foi pela ciclovia
elevada unidirecional em ambos os bordos.
A
ciclovia elevada foi proposta para as áreas com espaço limitado para
promover a segurança do ciclista, segregando-o fisicamente do fluxo dos
veículos automotores, ao mesmo tempo em que permite o acesso aos lotes
sem quebra da tipologia. O ciclista fica a 10 cm de altura a partir do
leito carroçável e a 5 cm da calçada, dando também segurança ao
pedestre. Para isso foi proibido o estacionamento em ambos os bordos da
pista. Foram mantidos os pontos de táxi no bordo oposto à ciclovia, e
nesses trechos a ciclovia passa a ter 2 m de largura.
Nos
trechos em que há ponto de ônibus a ciclovia se desloca para o limite
dos lotes, liberando a borda da pista para o acesso dos pedestres e
passageiros. "Essa é uma ciclovia que garante a proteção do ciclista e
evita situação de maior densidade do viário. Uma boa opção para onde não
há muito espaço", explica Ricardo.
Em
casos onde há maior espaço, é possível implantar ciclovias com
segregador, como no caso da rua Padre José Maria. Sua tipologia é de
ciclofaixa com segregador, tendo alterações mínimas na pavimentação e
drenagem, e ainda assim, fornecendo segurança para o ciclista. A TC
Urbes prefere o tacho ao tachão como segregador, uma vez que os veículos
motores ultrapassam ambos sem dificuldade, mas um ciclista pode cair
quando colide com o tachão.
Em
determinado trecho foram desenhadas ciclorrota no fluxo e ciclofaixa
com frades no contrafluxo, garantindo a segurança para os ciclistas que
estiverem trafegando no sentido contrário dos veículos automotores e
mantendo a viabilidade do tráfego de automóveis.
Para
pequenas áreas com trânsito complexo, com mudança de sentido do
tráfego, por exemplo, a TC Urbes optou por implementar a ciclovia sobre
alargamento da calçada.
O
projeto completo da ciclovia de Santo Amaro foi todo acordado com a
Companhia de Engenharia de Tráfego que fez algumas modificações e trocou
ciclovias por ciclorrotas, com a colocação de sinalização sobre o uso
da via por ciclistas. "Em geral, a CET não concordou com a criação de
ciclovias onde havia muito tráfego de veículos e trânsito parado, ou
onde a ciclovia teria de ficar na contramão." Agora, concluído o
projeto, falta a licitação para a construção.
Mapa da fase final de implantação da ciclovia de Santo Amaro, sem previsão de conclusão definida |
A
escolha de tipologias de acordo com cada tipo e uso de via é um dos
fatores para garantia da segurança dos ciclistas, assim como a
iluminação adequada. O projeto de Santo Amaro propõe acrescentar postes
de 7 m de altura com lâmpadas de vapor de mercúrio de 250 W.
Elas
serão instaladas a cada 15 m em vias de maior exposição do ciclista,
e/ou com alto tráfego de veículos motorizados, a fim de proporcionar uma
iluminação mais direcionada e concentrada nas áreas. Já em vias de
menor exposição do ciclista, e/ou de menor fluxo de veículos
motorizados, essa distância pode ser ampliada para 20 m.
Nas
vias que já possuem iluminação direcionada às futuras ciclovias e
ciclofaixas, a iluminação proposta deverá ser incorporada onde o
distanciamento da iluminação existente exceder os 15 m ou 20 m.
O
projeto também define as adaptações em termos de drenagem, a serem
feitos nas vias que receberem ciclovias. Em geral, quando não impedem o
escoamento da água pluvial para as bocas de lobo existentes, sua
construção terá 2% de inclinação para não haver empoçamento. Já nos
casos em que a ciclovia obstrui as bocas de lobo, o projeto prevê a
implantação de gárgulas (1%).
Projeto de implantação
Por
fim definidas todas as vias a receberem ciclovias e infraestrutura
adequada para o tráfego de bicicletas, é hora da criação de um plano de
implantação. A opção em Santo Amaro foi de estruturá-la por fases de
capilaridade.
A
primeira fase prevê as conexões entre bairros e estrutura à rede
cicloviária; é composta por 33,72 km de vias, na primeira etapa. Na
segunda etapa da primeira fase, a rede passa a ter um adicional de 15,88
km passando a ter um total de 54, 83 km aos finais de semana, como
forma de estimular o uso da bicicleta.
A
segunda fase tem o objetivo de propiciar o acesso aos bairros e
compreende a implantação de infraestrutura para a circulação da
bicicleta em 38,12 km de vias. Nos finais de semana, a rede recebe um
acréscimo de 7,08 km, menor do que na primeira fase porque parte desta
já foram agregadas ao sistema, como é o caso da av. Engenheiro Eusébio
Estevaux.
A terceira fase
tem o objetivo de propiciar circulação interna aos bairros. Esta fase
contempla a implantação de infraestrutura para a circulação da bicicleta
em 45,11 km de vias.Desenhos Técnicos
Clique aqui para ver ampliado |